A moda está cheia de graça

Por Aline Pavani e Daniela Castro

Há tempos os símbolos religiosos estão presentes no mundo da moda. O crucifixo, que já esteve no estilo gótico e foi usado de forma polêmica por Madonna, marcou forte presença nos desfiles desta última estação.

Aliás, polêmica sempre foi sinônimo de Madonna, já que a pauta da sua carreira até hoje é a mistura do sagrado com o profano, a começar pelo nome artístico escolhido (Madonna é o termo utilizado na Itália para Santa Maria, mãe de Jesus). Nos anos 1980, a cantora adotou o crucifixo e adicionou em seus clipes uma simbologia religiosa como forma de crítica a Igreja Católica. A polêmica aumentou a venda de seus CDs, além de alavancar a comercialização de acessórios em formatos de cruz.

Madoona
Madonna fazia a mistura entre o sagrado e o profano na década de 80 / Crédito: Divulgação

Para a Consultora de Imagem e Estilo, Andrea Vita, Madonna veio no sentido de se opor, “Ela sempre foi um objeto de choque social,” Andrea explica, “quando ela trouxe a cruz, trouxe os sutiãs com cones, o que remete a uma simbologia sexual muito forte. A Madonna usa os símbolos como oposição, e uma forma de dizer ‘vocês sabem realmente o que é esse símbolo, o que ele traz”, afirma Andrea.

O IMPACTO DOS EDITORIAIS DE MODA

Os editoriais de moda, por sua vez, aproveitam a onda para causar impacto, e aumentar a venda de suas revistas. Em fevereiro do ano passado, a VOGUE Brasil fotografou a modelo Izabel Goulart em um editorial com tema religioso. A iniciativa causou polêmica ao colocar Izabel com roupas que remetiam às vestes usadas por freiras, tendo como cenário as Igrejas barrocas de Salvador. Izabel exibe os novos vestidos longos e luxuosos da estação, que se contrapõem com os símbolos religiosos utilizados para a sessão fotográfica, como terços, crucifixos, e a mitra, espécie de chapéu pontudo e longo usado por bispos, cardeais e pelo papa.

(Crédito: VOGUE Brasil)
O editorial mostra a modelo Izabel Goulart com roupas que remetem a membros da Igreja Católica / Crédito: VOGUE Brasil

A consultora explica que em editoriais de moda as revistas precisam inovar para chamar mais atenção e vender mais. “Existe todo um contexto de moda, porque as revistas influenciam muito no mercado. Trabalhar com os opostos é uma forma de chocar”, diz.

 

O USO EXCLUSIVAMENTE ESTÉTICO

Tanto na passarela quanto nas ruas essa tendência continua crescente e muita gente nem ao menos sabe o que significa o símbolo da cruz, foi o que a estudante Michelle Marchesini afirmou: “Eu uso porque eu acho bonito, isso não faz de mim uma pessoa religiosa. A cruz pra mim não representa algo sagrado”. A estudante tem em seu armário blusas e colares com imagens de crucifixos decorados com pedrarias e em cores diferentes, o que vai contra o significado da cruz.

Segundo professor de Semiótica da PUC-Campinas, Fabiano Ormaneze, quando, como no caso de Michele, o símbolo religioso é usado fora do contexto ele deixa de ter aquele significado e passa a ser simplesmente um adorno: “Eles passam pelo processo que chamamos de dessimbolização, eles perdem o caráter de símbolo”, afirma Ormaneze.

O professor expõe ainda que esse processo ofende quem adiciona simbolismo àquele objeto: “Porque para quem estes objetos são um símbolo, aquilo é dotado de um valor, um significado, que é desrespeitado por aqueles que utilizam, mas não creem no mesmo simbolismo. Eles entendem essa dessimbolização como desrespeito”, garante.

Quem confirma a fala de Ormaneze é o Padre Bruno Gandolphi, pároco na Paróquia Santa Rita, do município de Itapira-SP, que diz que o maior problema no uso de símbolos religiosos unicamente para fins estéticos está na redução do sentido sacral dessas figuras. “O terço, o crucifixo, ou mesmo as imagens de santos católicos são usados para fins devocionais. Quando se pretende usar desses símbolos para fins meramente estilísticos ou simplesmente para satisfazer a moda vigente, esvazia-se a sacralidade dos mesmos, tornando banal aquilo que deve ser tratado com respeito”, declara.

Além disso, o padre afirma que dependendo do símbolo que a pessoa venha a usar, se este não corresponde à fé que ela professa, seu uso pode ser considerado como pecado.

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Muitos estilistas e grandes marcas viram na religião um tema impactante e relevante na hora de construir suas coleções e temáticas. O guarda-roupa de incontáveis pessoas no mundo hoje remete a essa esfera, mas não é por acaso. As coleções Inverno 2013-2014 contaram com muitas marcas que fizeram menção a renuncia do Papa Bento XVI em suas estampas, inclusive no exterior.

A religião e seu impacto na moda (Crédito: Aline Pavani e Daniela Castro)
A religião e seu impacto na moda / Crédito: Aline Pavani e Daniela Castro

A religião e a moda parecem conceitos tão distantes, mas fazem parte do cotidiano, e apesar de muitas vezes passarem despercebidos, chamar atenção para a relação entre as duas é uma forma de construir um olhar crítico.

 

Editado por Laura Pompeu

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