Por Ana Luiza Sesti e Bruna de Oliveira
Há um ano o Sistema Cantareira trabalhava com 55,2% da sua capacidade total de volume d’água. Hoje, o índice registrado entra no recorde do mais baixo da história, com 5,3%. Em contraste as fortes e abundantes chuvas que deixaram o sistema com quase 100% de sua capacidade total, 4 anos atrás, o Cantareira passa a cada dia deste segundo semestre de 2014, a ter um futuro incerto.
Mas o que aconteceu com o sistema que fornece uma das melhores águas do planeta, com padrões de qualidade superiores aos exigidos pela organização Mundial de Saúde (OMS)? Como o Cantareira chegou a um nível de água tão baixo? E o que fazer agora? Essas são algumas das perguntas que perturbam a população e asseguram o medo de ficar sem água.
O Especial ‘O Cantareira não canta sem água’ traz esclarecimentos sobre a pior crise hídrica da história do estado de São Paulo. E para entendê-la, primeiro é preciso conhecer o Sistema Cantareira.

ENTENDA O CANTAREIRA
O Sistema Cantareira é um dos maiores sistemas produtores de água do mundo. Abastece 5,2 milhões de habitantes nas bacias PCJ (Piracicaba, Capivari e Jundiaí) e outros 9 milhões na grande São Paulo. Apesar do nome, a água não vem apenas da reserva do Cantareira e são 6 os reservatórios que compõem o sistema: Jaguari e Jacareí (interligados), Cachoeira, Atibainha, Águas Claras e Paiva Castro.
As 6 represas são interligadas por 48 km de túneis que foram pensados para o aproveitamento de desníveis e acumulo de água por gravidade. Atualmente, o sistema trata 33 mil litros de água por segundo e é considerado um dos melhores do mundo, além de ser a maior Estação da América Latina.
O nome “Cantareira” foi dado pelos tropeiros que no século VXI faziam o comércio na região de São Paulo e tinham o costume de armazenar na região jarros de barro cheios d´água, chamados cântaros em apoios de nome Cantareira. A água armazenada era adquirida ali mesmo, devido a enorme quantidade de nascentes e córregos pertencentes ao local.
A CRISE
Dia 01 de fevereiro de 2014, a Companhia de Saneamento Básico do estado de São Paulo, a Sabesp, anunciou um programa de desconto para os consumidores abastecidos pelo Sistema Cantareira. Aqueles que economizassem água teriam suas contas diminuídas em até 48% do valor.
A crise estava instalada. Desde dezembro de 2013 as chuvas não atingiam os níveis suficientes para um controle do sistema e o nível do Cantareira já chegava a 21,9% da capacidade total. Foi dada a largada para a economia do bem mais importante do ser humano.
Desde então os níveis só vieram a cair. Em março, começou a ser usado o volume morto. E no final do mês de setembro a Sabesp pediu autorização aos órgãos reguladores para o uso da 2ªcota (106 milhões de litros de água) de volume morto do Cantareira.
O que é o volume morto? O volume morto é o reservatório de água que fica abaixo dos canos de captação. Há hipóteses de que essa água é de má qualidade, mas segundo o governo de São Paulo, essa água não apresenta riscos, e é tratada antes de chegar ás torneiras.
Segundo o Governo de São Paulo e a Sabesp o principal fator responsável pela crise hídrica foi a falta de chuva, porém para o Professor Doutor da PUC-Campinas, Antonio Carlos Demanboro, especializado em gestão ambiental, meio ambiente e sustentabilidade, o principal motivo foi a falta de planejamento. Sem entrar em detalhes e explicações o professor afirmou que há mais perdas na rede de distribuição de água até chegar ás casas dos consumidores.
Mas, realmente a chuva não apareceu no Cantareira. A meteorologista Ana Maria Avila, do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas a Agricultura da Unicamp, o Cepagri explicou que o Estado de São Paulo passa por uma estiagem e com chuvas a baixo da média. “Nós tivemos uma estiagem neste último ano, sobretudo. Estamos com chuva a baixo da média, praticamente em todos os meses. Apenas março deste ano agora de 2014 e agora em setembro nós tivemos chuvas em torno da média. Os demais meses, a chuva esteve a baixo da média histórica. O verão, que é a estação onde a gente tem a recuperação dos mananciais e dos reservatórios, que nós temos as chuvas concentradas em dezembro, janeiro, fevereiro, neste último verão deste último ano, nós tivemos apenas 40% do total esperado para a estação. Então agravado a este todo, com chuva a baixo do média, o verão que é quando a gente tem essa recuperação das águas, a gente não teve”, completou a meteorologista.

Outro fator para os níveis dos reservatórios não aumentarem, além da falta de chuva são as temperaturas elevadas que acentuam a evaporação. “As temperaturas devido essa ausência da chuva ficaram excessivamente altas o que acentua a evaporação. A água livre exposta evapora em torno de 4 a 5 milímetros por dia, nesses dias com temperaturas a cima dos 30 graus, então é uma quantidade considerável de água que é evaporada”, explicou Ana Maria.
Desde o princípio a Sabesp descartou a implantação de racionamento, porém para a engenheira civil, Camila Maria Souza, a melhor forma de garantir a água além da conscientização é o racionamento. “Desde que se percebeu a crise, já era pra ter começado o racionamento, de pelo menos algumas horas por dias, ou dia sim ou dia não, enfim alguma medida pra tentar reter esse nível mínimo da água, mas não é o que esta ocorrendo. Estão tirando todos s níveis mínimos e infelizmente daqui a um tempo, quando acabar o mínimo, se não chover, não tem uma água pra racionar e esse é um grande problema”, explicou Camila.
FUTURO
Sem chuva há grande possibilidade de o Cantareira se esgotar e caso isso ocorra o solo do sistema pode secar não havendo mais possibilidades de encher novamente. Para o professor Antonio Carlos o solo pode secar com um volume muito baixo de água e o Estado de São Paulo não teria mais esta fonte disponível.
Entretanto, segundo a meteorologista Ana Maria há previsões de chuvas para a região do Cantareira. “Nós estamos com uma expectativa que a partir do dia 20 de outubro a gente tenha um retorno gradual das frentes frias. Nós estamos agora nesses próximos dias com temperaturas muitos altas, essa massa de ar seco, mas a expectativa é que a partir do dia 20 nós temos uma mudança nesse quadro e ai então a gente passa a ter as chuvas normais. Esperasse um novembro dentro da normalidade e um retorno garantido das chuvas que ocorrem no final da primavera e verão”, explica Avila.
Não é por isso que a economia de água deve ser interrompida, pois mesmo que chova para o volumo do Cantareira subir, levará muito tempo para que o sistema volte ao normal. “Mesmo que nesse verão a gente tenha a chuva em torno da média esperada não é esperado que o Cantareira se recupere totalmente, volte a ter o seu nível normal. Se a gente tiver a chuva na média, em torno de 3 e 4 anos pelo menos, pra ter a recuperação, se neste período a gente tiver chuva dentro da normalidade”, ressaltou Ana Maria.
E quanto aos racionamentos, que até agora não foram cogitados pelo Governo de São Paulo, a Sanasa confirma que o “racionamento ou rodízio estão descartados, já que a população tem colaborado, gerando uma economiza de 20% no consumo de água”.
*A Sabesp foi procurada para dar esclarecimentos sobre o assunto, porém informou que não atendia estudantes de jornalismo.


Editado por Aline Pavani